Com muros repintados, pilares descaracterizados e segurança ausente há mais de seis meses, o vasto terreno pertencente ao grupo AAA Activos, localizado na zona do Tandy, antigo Distrito do Baia, em Viana, está a ser tomado por populares, num processo de ocupação e loteamento clandestino que avança a olhos vistos.
Por Mwata Santos
O que antes era um imponente quintal murado ligado ao império empresarial de Carlos São Vicente, hoje dá lugar a pequenas construções de blocos, erguidas entre montes de lixo e uma vegetação cerrada, numa verdadeira “mata urbana” que se formou com o abandono prolongado do espaço.
Quintino, nome fictício, motoqueiro de profissão e morador da zona, lembra-se bem dos primeiros sinais da tentativa de usurpação: “Primeiro tiraram os feitios dos pilares, depois pintaram os muros de azul. Pensavam que ninguém ia notar, mas toda a gente aqui sabe que isso era dos AAA. Até tentaram amarrar o segurança uma vez para invadir.”
Apesar de uma intervenção pontual das autoridades ter inviabilizado a primeira tentativa de ocupação ilegal com a construção de casebres improvisados, a ausência de fiscalização e a retirada dos guardas, que já não são vistos no local há mais de meio ano, deixaram o terreno vulnerável. Actualmente, o que era um quintal vigiado tornou-se local de despejo de resíduos e loteamento informal.
De acordo com vizinhos e testemunhas no local, um suposto “novo dono” tem estado a vender lotes dentro do quintal, cobrando 100 mil kwanzas por cada parcela, com o argumento de que o terreno pertenceu à sua falecida mãe e que era lavra da família. “Ele aparece com um caderno, tira medidas e diz que está tudo legal”, conta um morador que pediu anonimato. “Mas nós sabemos que isso era do grupo AAA. Está tudo a ser feito à luz do dia.”
Nos arredores, a circulação de camiões basculantes, cisternas de água e mistura de cimento indicam que as obras, que começaram de forma tímida, agora avançam com rapidez, como se nada estivesse fora da lei.
A Procuradoria-Geral da República (PGR), por via do Serviço Nacional de Recuperação de Activos, anunciou em 2020 a apreensão de diversos imóveis pertencentes ao grupo AAA, entre os quais os edifícios AAA, Hotéis IU e IKA, o edifício IRCA na Rua Amílcar Cabral e participações no Standard Bank Angola. No entanto, os dois quintais com mais de 40 hectares cada, do outro lado dos Hotéis IU Viana, no Kapalanga, não constam da lista pública de bens recuperados.
O silêncio das autoridades levanta dúvidas: o terreno foi esquecido ou ignorado no processo de recuperação de activos? Enquanto isso, dezenas de famílias, levadas pela necessidade ou iludidas pela aparente legalidade da venda dos lotes, seguem a construir os seus sonhos sobre uma propriedade cuja titularidade continua envolta em incertezas.
Tentativas de contacto com o Serviço Nacional de Recuperação de Activos para esclarecer o estatuto legal dos referidos terrenos não tiveram, até ao momento, qualquer resposta.